A minha história é a mais difícil de contar. Sou um cão feliz. Rafeira por parte do pai, princesa pelo lado da mãe.
Um dia vi uns pés enormes a caminhar para mim e pensei,
se não correr para eles agora, nunca mais terei sorte na vida. Precipitei-me,
tropecei em três ervas rasteiras, fui de focinho ao chão. Seguraram-me duas
mãos que me elevaram no ar, e que no momento me pareceu ser a altura de um
prédio de dez andares. Uns dentes brancos e um enorme sorriso e eu dando o meu
melhor, fiz estes olhos meigos, quase, quase, a chegar às patas.
Fomos os dois viver na cidade, o meu dono e eu. Cresci e
as minhas orelhas cresceram ainda mais do que eu. Quando me solto numa corrida
doida, elas levantam-se fazendo um ângulo de 90º com o meu pescoço e se eu
acelerasse, estou certa de que voaria. Às vezes sinto a cabeça cheia de
pássaros.
Não gosto do monstro que habita o saco do aspirador,
acho-o desprezível e é inacreditável ser o meu dono a ligá-lo, como faz com o
despertador. Aí mora um outro monstro, só que mais pequeno e estridente. Não
vale a pena enfrentá-los, escondemo-nos debaixo das mantas e fingimos que não
existem.
Os homens e os cães aprendem imensas coisas uns com os
outros. A rosnar ao vizinho do 3º esquerdo, por exemplo, que embirra com cães,
tapetes fora do sítio, dias de sol e panos de pó roídos por mim; a partilhar os
restos do frigorífico nos domingos à noite quando chove e a ladrar às
caravanas que passam. Isto das caravanas é uma metáfora, como devem calcular.
Mas o mais significativo, é os cães entenderem a
linguagem dos donos e estes responderem-nos em, aufs, aufs! que é a linguagem
perdida dos cães.
Nos dias úteis, que são aqueles dias em que os nossos
donos se esfalfam a levar e a trazer bolas aos patrões e estes nem uma festa no
pelo, faço uma escapadela. Saio pela portinhola da porta da cozinha e vou para
as ruas de focinho no ar. Aventuro-me nos becos sem saída, nos jardins, à porta
das lojas, mais longe, nos descampados. Depois regresso, a língua de fora,
cheia de sede, uma pulga atrás da orelha e espero pelo meu dono à porta de casa.
Quando ele aparece, a língua de fora, um ar cansado, eu
faço uns olhos meigos, quase, quase, a chegar ao chão.
retratos quase vadios
terceiro e último conto: Francisca
em Portugal são abatidos 100 000 animais a cada ano
se não os abatêssemos, não seríamos tão abatidos
22 comentários:
.
.
. "quase, quase, a chegar ao chão." . preciso agora de um tempo im.preciso . preciso .
.
. porque o amor deste momento . tem também o seu tempo . para que possa então . exteriorizar.se .
.
. íssimo . sempre feliz .
.
. e dois aufs . agradecidos . :) . e orgulhosa.mente gratos . en.ternecidos .
.
.
Kriu?
Eu permaneço em lista de espera... em espera e à espera de outros voos, nos quais eu possa, participar e liderar...
Mas duvido que saibas pintar-me e muito menos contar a minha história...
Parabéns à Siri Francisca Menezes Fonseca dos Santos Jardim!
Kriu!
Orgulho-me de que faças parte da minha família... E por isso mesmo escolhi-te e nunca te abandonarei...
(Não és como aquela badocha das traseiras de Fânzeres, que abandonou o cão, quando foi posta fora de casa pelo marido, já fartíssimo dela...)
Parabéns à Francisca, por ter sabido tão bem escolher o "dono"!
Gosto de histórias de cães.
Cresci no meio deles...
Tem um bom fim de semana, querida amiga Manuela.
Beijo.
MANUELA BAPTISTA
Tudo isto é muito bonito mas só há uma coisa que eu não percebo:
Tu escreves sobre cães e eu escrevi um tratado, filosófico mesmo, chamado With The Cat que consta das minhas publicações, com um destinatário preciso, a nossa gata.
Pois mesmo assim e apesar de tudo, é o teu colo que ela prefere!
Ingratidões ...!
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 19 de Outubro de 2013
Um dia, volto a ler isto à procura de inspiração
Recontarei a tua história
na perspectiva diferente da do cão
mas daquele
que os deixa abater
Um dia...
cada nova história que aqui deixas é puro deleite para quem lê.
acho que ia adorar a Francisca.
bom domingo Manela
BEijos
:)
Olá, Manuela!
Gostei muito de ficar a saber sobre o mundo dos homens, visto por este encanto de cadela ladina, e capaz de fazer qualquer dono tão feliz como ela...
E afinal esta história nada tinha de difícil no contar, para quem tão bem percebe da poda...
Um abraço; bom resto de Domingo
Vitor
Gostei tanto da Franscisca!
" A civilização de um povo vê-se na forma como tratam os seus animais." Ghandi.
Beijinhos
Gostei de conhecer a Francisca. E o dono dela, apesar de que... há tantos como ele...!
Um abraço
MANUELA BAPTISTA
Gostei da história da FRANCISCA
rafeira por parte do pai,
princesa pelo lado da mãe.
Que a felicidade esteja por aí.
No "Momentos Perfeitos"
mostro os meus trabalhos
no raid deste ano
e foram distinguidos com uma "menção honrosa"
Caso queira, dê um saltinho a:
http://pensamentosimagens.blogspot.pt
Um abraço e boa semana
A Francisca...o seu enorme talento...os animais abandonados(já
se abandonam pessoas e se matam
bebés...)
A Francisca teve a liberdade de
passear,(liberdade) e ter um dono
que a recebia de volta(felicidade).
Bj.
Irene Alves
Francisca tu és um doce!
Não te percas nas tua saídas e cuidado com os homens da câmara, sabes que eles apanham os canitos fugidios?
Agora toma lá um biscoito ^..^
Kriu?
Estamos quase no inverno e já não se justifica teres o búzio na "entrada" do teu blogue, por muito bonito que seja...
Porque não o trocas por uma rosinha branca, descaída e desmaiada, com reflexos e tudo?
Assim, no Natal, até podias enfeitá-la com luzinhas que acendessem e apagassem... e ficarias com o teu blogue tipo a loja do chinês!
Achas saloia esta minha ideia?
Quanto ao fundo negro do teu blogue, o mesmo, provoca por aí tal inveja, que até já te plagiaram... Que gentinha mais sem ideias...
Kriu!
Cá para mim, o que ficaria muito bonito na entrada do teu blogue, seria uma bela seringa... pousada diagonalmente bem em cima daquele livro que te levou e elevou a seres aquilo que és hoje, uma grande "Poetisa"...
.
.
. risos sibilantes . até às lágrimas . ! . ah ah ah ah ah ah ah . :)))))))))))))))))))) .
.
.
Animais merecem respeito....
Beijo Lisette,
E dizes tudo, sem ruído, apenas com alma de poeta e a sabedoria de quem está atento à vida...e são tão poucos.
Beijos
Passei para desejar um bom
fim de semana.Bjs.
Irene Alves
Gosto muito de animais e quanto mais ternos eles são mais depressa nos afeiçoamos a eles.
Existem cães que são muito mais espertos que os seus donos. Conseguem ver quando é que eles os vão abandonar nas travessas mais escuras da cidade ou pior quando tencionam abatê-los porque carregam muitos anos e transportam visitas indesejadas.
Esta Cadela parece-me que teve sorte. Chegou inteira ao fim e quando se sentia a mais escapava-se e ia dar uma volta até que a dor de cotovelo passasse ao patrão...
Beijinhos. Bom fim de semana.
Não acrescento nada. Sou apenas mais uma que lê - deliciada, claro! - sobre a Francisca, sobre a linguagem perdida dos cães...
O meu abraço! Para ela também :)
Sabe, eu tenho um cão - chamado Patrick. È um boxer. Chegou pequenino. As orelhas não cresceram muito, mas lhe dão trabalho, as vezes precisa de remédios. São frias. E eu adoro coçá-las. Ele parece gostar porque geme. Faz festa quando chego e fica triste quando tenho que sair, mas se comporta porque sabe que eu volto. Deita no sofá e dorme. Quando abro a porta a festa, o passeio, o carinho e nós dois crescemos. Eu aprendi com ele a ser mais humana, mas ele nunca deixou de ser canino, embora as vezes pense que é gente. Outro dia olhou pra mim de maneira estranha no elevador. Estávamos a sair os dois para um passeio. A frente o homem a dizer asneiras a sua senhora. Esbravejou. Disse coisas desnecessárias e os dois saíram a ralhar um com o outro. Ele, sentado e eu ao lado, eu sei, não me perguntei, mas sei o que ele pensou "e eu quem preciso de coleiras"... rs
bacio
Enviar um comentário