Da enorme responsabilidade de partilhar palavras, histórias, memórias, fica a pressentida consciência de que nós e os outros, somos também matéria, não apenas a dos sonhos, mas dos rostos, das mãos, dos cabelos, dos olhos, do sangue, das lágrimas e a outra mais subtil, de um gesto, de um riso ou de um andar.
Estou aqui a contar histórias porquê?
Numa tradição oral e familiar tive a sorte de ter quem me as contasse e repetisse, lenga-lenga doce em adormecer tranquilo e uma infância com lugar cativo para o faz de conta, para a representação da realidade, para a ficção.
Diziam-me que eu tinha o vício da leitura, engolia livros, escondia livros na carteira da escola e cheguei a fazer a loucura de ler no meio da rua, a caminhar. Ainda hoje perante um pedaço de papel impresso caído no chão, paro, seguro-o com o pé e leio-o.
Pelo meu percurso profissional e através dele (sou Educadora de Infância) exercitei e conscientemente desenvolvi a arte do Conto, da leitura de obras de grandes escritores para a infância, da construção de histórias, porque estamos na pré-escrita, e na sua encenação. Encenando construímo-nos e modificamo-nos, o Teatro é uma história que se vive.
Já o enredo é uma intriga, tece-se, entrelaça-se, pode surgir a partir de um nome, de um sentimento, de um barco solitário desenhado no horizonte, de uma ideia que os outros me emprestaram, inocentes e ingénuos, mas apropriar-me dessa ideia não é inocente e muito menos ingénuo.
Estou aqui a contar histórias porquê?
Numa tradição oral e familiar tive a sorte de ter quem me as contasse e repetisse, lenga-lenga doce em adormecer tranquilo e uma infância com lugar cativo para o faz de conta, para a representação da realidade, para a ficção.
Diziam-me que eu tinha o vício da leitura, engolia livros, escondia livros na carteira da escola e cheguei a fazer a loucura de ler no meio da rua, a caminhar. Ainda hoje perante um pedaço de papel impresso caído no chão, paro, seguro-o com o pé e leio-o.
Pelo meu percurso profissional e através dele (sou Educadora de Infância) exercitei e conscientemente desenvolvi a arte do Conto, da leitura de obras de grandes escritores para a infância, da construção de histórias, porque estamos na pré-escrita, e na sua encenação. Encenando construímo-nos e modificamo-nos, o Teatro é uma história que se vive.
Já o enredo é uma intriga, tece-se, entrelaça-se, pode surgir a partir de um nome, de um sentimento, de um barco solitário desenhado no horizonte, de uma ideia que os outros me emprestaram, inocentes e ingénuos, mas apropriar-me dessa ideia não é inocente e muito menos ingénuo.
Quando se cria um personagem ele sobrevive para lá de nós, ganha autonomia e interage com quem se aproxima dele.
Estar aqui neste espaço dá-me prazer, mas criado o modelo, forma, molde, ficamos presos e é então que nos devemos inquietar.
Miguel Seabra, actor, fundador e Director do Teatro Meridional, diz que os artistas, os criadores, devem falhar e sentir inquietação.
Estar aqui neste espaço dá-me prazer, mas criado o modelo, forma, molde, ficamos presos e é então que nos devemos inquietar.
Miguel Seabra, actor, fundador e Director do Teatro Meridional, diz que os artistas, os criadores, devem falhar e sentir inquietação.
Longe de mim considerar-me artista, não tenho a veleidade de pensar que estes textos deveriam ser publicados em livro, não é este o caminho, mas sou Criadora. E criando inquieto-me.
Estar aqui na mesma rota de centenas de pessoas que nos dão a conhecer pedaços de si, alegres, crispados, magoados, poéticos, pueris, sem pés nem cabeça, artísticos, solidários, solitários, com uma necessidade de partilhar dores, amores, debilidades e engenhos, de se exporem escondendo-se, é uma viagem alucinante, é um livro de desassossego.
Depois de falhar, quero desassossegadamente inquietar-vos.
Estar aqui na mesma rota de centenas de pessoas que nos dão a conhecer pedaços de si, alegres, crispados, magoados, poéticos, pueris, sem pés nem cabeça, artísticos, solidários, solitários, com uma necessidade de partilhar dores, amores, debilidades e engenhos, de se exporem escondendo-se, é uma viagem alucinante, é um livro de desassossego.
Depois de falhar, quero desassossegadamente inquietar-vos.
-
Agradeço ao Miguel Seabra sobrevivente lutador, e ao seu Meridional, a inspiração para este apontamento. Tantas estradas, as mesmas rotas.
-
-
Manuela Baptista
Estoril, 2 de Novembro 2009
-
Teatro Meridional: http://www.teatromeridional.net/
27 comentários:
Manela:
É uma responsabilidade partilhar palavras, histórias, sentimentos, memórias... sem dúvida! Mas também é responsabilidade, recebê-las, acarinhá-las e guardá-las com todo o respeito que elas no merecem.
Como tu fazes quando apanhas um papel impresso ,do chão...para o leres! É o respeito pela palavra por quem desde cedo, aprendeu a lidar com ela. E nota-se!
Também é uma responsabilidade trabalhar-se o dom que se tem, contando histórias, fazendo o enredo de outras... e desassossegando muitas mentes.
É sinal que o que escreves já não é teu... partiu por vários caminhos até á lonjura mais longíqua... Ainda bem!
O Profeta é um dos meus livros de cabeceira!
Um beijo carinhoso e faz o teu caminho...que é lindo!. Eu estarei sempre cá para ler as tuas histórias.
Graça
Graça
Partilhando histórias e poemas, com um Profeta à cabeceira, é bonito!
Um beijinho
Manuela Baptista
MANUELA BAPTISTA
Enquanto esperávamos pelo início da peça do Teatro Meridional, Brasil, Outras Rotas, foi muito agradável, reconfortante a conversa que tivemos com o Miguel Seabra sobre a arte, a criação, a sua qualidade e a sua massa que de inquietação, das suas falhas, desinstalação e permanente interrogação se ergue como se erguem as tuas histórias e elas próprias na interrogação, inquietação se fundam como aqui connosco partilhas nas encruzilhadas de que se faz o seu caminho.
O que é o artista senão um criador?
O que é o criador senão um artista?
Vais bem, cais, levantas-te e prossegues
Um beijo
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 2 de Novembro de 2009
Cheguei Manuela!
E estou aqui na mesma rota,
e só mesmo dizer-lhe o bom que é estar aqui no maior "desassossego"!
Já senti a tão grande e maravilhosa inquietude de sermos muitos e tão diferentes. Que a "viagem da partilha" se inicie o quanto antes!
Estou a embarcar...
Beijinhos,
dulce
DULCE AC
Ah grande Dulce ...!
Desculpe-me antecipar-me mas serve apenas para Lhe dizer que, logo que possa, minha mulher Lhe dará as devidas boas vindas ...
Beijinhos
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 3 de Novembro de 2009
Manuela!
Gosto quando entro num blog e encontro post q me faz refletir.
E o teu é assim.
Beijo e um grande abraço.
Dulce
O seu avatar fica bem aqui junto dos outros seguidores, deu cor ao quadradinho!
Ora como o Jaime fez as honras da casa, a mim resta-me pedir-lhe desculpa pelo meu atraso e servir o chá...
A história do chá é uma bricandeira (que levamos muito a sério) entre a Graça Pereira e a Alegria, uma Brasileira muito querida e amiga, que nos fazia sempre uma visita convidando-nos para "o café da manhã". Nós retribuíamos com o chá da meia-noite.
Sem sabermos porquê, a Alegria, Renata de seu nome desapareceu, deixando-nos saudades. Os blogs têm destas coisas. Pessoas completamente diferentes na idade, na comunidade onde habitam, ligam-se e conhecem-se, sem se conhecer.
Seja bem vinda a estas viagens, mas temo que esta página não atraia muita gente, estão sempre à espera de uma história...
Será na próxima.
Um beijinho
Manuela Baptista
Minha querida Mariana
Peço desculpa por, no comentário anterior ter avaliado mal todos os meus amigos deste espaço, afirmando que preferem histórias a reflexões.
Mal acabei de o escrever e eis que aparece a Mariana a demonstrar o seu gosto pela reflexão!
Deixa-me muito feliz!
Um grande abraço
Manuela Baptista
Jaime
os cavalheiros no fim!
Sim de facto disse asneira, um criador é um artista.
Foi assim um tropeção antes de cair...
Manuela Baptista
Manuela,
O escritor é aquele que, pinta sem pincéis, faz música sem o violino, dança sem ter pés. Através das letras, das palavras e das frases torna-se no mais poderoso dos seres vivos" Ai, palavras ai palavras, que estranha potência a vossa..."
Um beijinho
Filomena
Cecília Meireles, sempre sábia e perigosa?!
Um beijo à Filomena
Manuela Baptista
Manuela,
... mas sou Criadora. E criando inquieto-me.
Cito-a do seu texto, pois, em síntese, julgo ser esse estado de espírito que tece as malhas da criação de um artista.
Pela força e clareza expressiva que consegue nos seus textos, acho que deve continuar a inquietar-se, sem receios de, artisticamente, criar.
Para acabar, direi que, bem jovem, depois de compulsivamente me apagarem a luz do quarto, ia ler para a janela, pois tinha a sorte, de ter um candeeiro bem perto, no passeio, à altura do primeiro andar.
Hoje leio bem menos do que desejaria, por razão de cansaço visual, por um lado, e, por outro, pelo efeito da diabetes, que vão contribuindo impiedosamente, para a cada vez mais reduzida acuidade na visão.
Um abraço,
Zé
Zé Ferreira
Falando em síntese, a sua também está clara e expressiva.
Lamento a diabetes, sobretudo se isso o impede de ler.
No entanto quem muito leu tem um baú cheio de tesouros, aquilo a que chamamos bagagem, que ainda nos continua a levar longe.
Os seus filhos lêem?
Um abraço
Manuela Baptista
Manuela,
Só para confirmar que dos cinco (filhos) só um, por sinal uma, a Rita, tem gosto pela leitura.
Isto não obstante ter a todos, por igual, e de forma recorrente, ter enfatizado a vantagem do exercício da leitura, nem que fosse banda desenhada.
Resultado?
Frustração face à esmagadora e apelativa panóplia de opções (diria derivações) cibernéticas, comunicacionais e outras que tais...
Quer queiramos, quer não temos de reconhecer que hoje, salvo raras excepções, só o Marketing vende livros!
Este último livro do Saramago, convenhamos, é um caso exemplar!
Zé
Zé
A Rita sai a ganhar, quem lê, fala e escreve melhor, e os outros?
Encontrarão nas outras ferramentas o mesmo voo, ou diferentes formas de voar.
Manuela Baptista
Manuela,
Bom Dia!
Num pulinho vir aqui só para lhe dizer que não importa do que se trate. Se de uma boa história, se de uma boa conversa. O que importa mesmo é que escrevamos e desse modo ficaremos mais perto uns dos outros, interagiremos, umas vezes mais a sério outras nem tanto.
Mas estaremos (quase) sempre a partilhar algo de nós mesmos. E, claro que SIM, estas partilhas poderão promover-nos boas reflexões. Normalmente é o que acontece.
Um bom dia para Si!
E muitos beijinhos,
Dulce AC
Obrigada Dulce,
pelas suas boas ideias!
O que importa mesmo é escrever.
Beijinhos para si também
Manuela Baptista
(...) Encenando construímo-nos e modificamo-nos, o Teatro é uma história que se vive.(...)
Talvez me tenha expressado mal, não são tanto ideias, o que me importa não é só o facto de podermos comunicar escrevendo (escreve-se muito por ai...) eu vou mais por aqui, aproveitando as suas palavras que supra transcrevi...
É esta "vivência" que me é tão grata. E aqui no seu blog Manuela,nas palavras que nos escreve ... e depois, no acontecer de outras palavras, encontrei o caminho à reflexão, que julgo importante. E, esta, muitas vezes séria e, outras, não deixando de o ser, também com humor e divertimento!
São apontamentos de momentos pensados e deixados aqui.
Gosto muito. Tenha eu o tempo necessário para vir e poder Estar muitas vezes...
Beijinhos,
Dulce
O que eu queria dizer, Dulce é que dos seus comentários me surgiram ideias, assim como quem acende uma luz!
Logo se verá!
A inspiração tem muitos atalhos e eu às vezes perco-me nos seus meandros.
Manuela Baptista
Que repousante desassossego encontrei nesta rota. Obrigada, Manuela. Não quer seguir o caminho do Estoril a Sintra e vir aqui ao meu espaço contar e ensinar a contar histórias?
Um grande beijinho,
Maria Emília
Maria Emília
Muitas vezes seguimos o caminho que conduz a Sintra, ao café da Natália,à loja "Zen", aos saloios, aos verdes e aos palácios.
Gostamos de Sintra!
No seu espaço, contam-se histórias?
Quem sabe...
Um beijinho
Manuela Baptista
No caminhar das nossas palavras, para cá e para lá, fez-se Luz e as Ideias, essas, sempre estiveram lá...é verdade Manuela.
Há dias assim, em que o natural e óbvio se transforma e deixa de o ser, por momentos...
Um grande beijinho,
Dulce.
Dulce
agora com a luz que acendi
já estou mais lá em cima.
Beijinhos
Manuela Baptista
Olá Manuela,
Esta reflexão inquietante é extremamente linda e realista. Não é por acaso que é através das artes que o mundo avança, é a inquietação do artista que tudo interroga e tudo põe em questão que vai criando prorrogativas para pormos em causa o estabelecido.
Inquietemo-nos pois, questionemo-nos a nós próprios, para nos reconstruirmos mais conscientes e responsáveis pelos passos que damos.
Quanto ao livro não concordo consigo, mesmo com todas as inquietações e por isso mesmo, começa a ter por aqui basta matéria para uma inquietante publicação de contos, que levarão todos os leitores a reflectirem a vida e o mundo.
Beijinhos
Branca
Branca
aqui nesta rota
já estou consigo mais à frente!
Gostei da sua reflexão.
Um beijo
Manuela Baptista
Ressalvo a troca do v pelo b, vasta e não basta, é a pronúncia do Norte, :)
Beijo
Olá Vranca!!!
MB
Enviar um comentário