Éramos cinco. De um lado duas raparigas, do outro mais duas raparigas e um rapaz.
Ligados pelo parentesco, pela proximidade das famílias, cúmplices pela idade, pelas casas que partilhávamos nas férias chamadas grandes e nas outras, de Inverno e sapatos na chaminé.
No Inverno tínhamos um piano, a Avenida de Roma, o cinema Tivoli, os lanches na Pastelaria Ferrari, as casas de brinquedos da Baixa .
No Verão havia um relvado, um baloiço, esconderijos no quintal, o mar, o cinema ao ar livre, as bolas de Berlim e os gelados Santini.
As avós rezavam pela conversão da Rússia, faziam pão-de-ló ao Domingo e no catecismo havia uma imagem do Titanic a afundar-se, porque os homens tinham ousado desafiar Deus.
No Inverno tínhamos um piano, a Avenida de Roma, o cinema Tivoli, os lanches na Pastelaria Ferrari, as casas de brinquedos da Baixa .
No Verão havia um relvado, um baloiço, esconderijos no quintal, o mar, o cinema ao ar livre, as bolas de Berlim e os gelados Santini.
As avós rezavam pela conversão da Rússia, faziam pão-de-ló ao Domingo e no catecismo havia uma imagem do Titanic a afundar-se, porque os homens tinham ousado desafiar Deus.
Nos livros de leitura, as meninas brincavam com as bonecas e os meninos com papagaios de papel, mas eram todos bons e amigos dos pobrezinhos.
Os adultos, sempre ocupados nas suas tarefas, mandavam-nos brincar e nós íamos e nesse faz de conta imenso inventávamos códigos, linguagens secretas, mundos paralelos.
Os adultos, sempre ocupados nas suas tarefas, mandavam-nos brincar e nós íamos e nesse faz de conta imenso inventávamos códigos, linguagens secretas, mundos paralelos.
Crescer não é muito fácil e acontece devagar.
Mas às vezes a vida é como o Titanic, dá uma volta e fica de pernas para o ar. As famílias separaram-se, distanciaram-se.
Sentimos saudades, trocámos cartas, prometemos fugir para nos encontrarmos, uma longa pausa instalou-se entre nós e perguntámo-nos como poderíamos viver uns sem os outros.
Foi um longo Intermezzo entre dois actos das nossas vidas.
Muitos anos depois quando nos reencontrámos, estranhámo-nos e apenas conseguimos reconhecer uns olhos verdes acinzentados, umas mãos finas e belas, uma timidez de criança, a generosidade de um coração e um egoísmo extremo.
Entre os irmãos outrora inseparáveis, existiam agora invejas, mal entendidos, golpes profundos, feridas que não iriam sarar.
E aquilo que ao longo do tempo eu imaginei que estava a perder, tornou-se na espantosa certeza de que não tinha perdido nada.
A riqueza de uma infância permanece, mas é raro um Concerto a cinco mãos.
Mas às vezes a vida é como o Titanic, dá uma volta e fica de pernas para o ar. As famílias separaram-se, distanciaram-se.
Sentimos saudades, trocámos cartas, prometemos fugir para nos encontrarmos, uma longa pausa instalou-se entre nós e perguntámo-nos como poderíamos viver uns sem os outros.
Foi um longo Intermezzo entre dois actos das nossas vidas.
Muitos anos depois quando nos reencontrámos, estranhámo-nos e apenas conseguimos reconhecer uns olhos verdes acinzentados, umas mãos finas e belas, uma timidez de criança, a generosidade de um coração e um egoísmo extremo.
Entre os irmãos outrora inseparáveis, existiam agora invejas, mal entendidos, golpes profundos, feridas que não iriam sarar.
E aquilo que ao longo do tempo eu imaginei que estava a perder, tornou-se na espantosa certeza de que não tinha perdido nada.
A riqueza de uma infância permanece, mas é raro um Concerto a cinco mãos.
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Perante um sinal fechado, quem não se impacienta? Mas é esta condição que nos protege da dor. Aceleramos depois.
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Manuela Baptista
Estoril, 28 de Outubro 2009
39 comentários:
Olá Manuela,
Bons tempos esses que recordas...todos temos os nossos, mas de facto são tempos irrepetíveis e as pessoas sofrem grandes mutações...
Bjiinhos,
Marisa
...Guardo boas lembranças da minha infância, também.Mas acontece exatamente assim.As pessoas se distanciam,se amarguram e se transformam em quase desconhecidas...
São os ciclos da vida .
"A riqueza de uma infância permanece, mas é raro um Concerto a cinco mãos."
Adorei.
Beijinhos
Marisa
Somos de facto mutantes.
Agora lembrei-me de David Cronenberg e dos seus filmes. É o meu lado mosca a acordar...
Espero que compreenda o meu
sentido de humor.
Um abraço
Manuela Baptista
Ó Linda
e do Paulinho da Viola, não gostou?
O Concerto a Cinco Mãos seria possível com o vosso pianista João Carlos Martins, que debilitado pela doença, não desanimou e continuou a tocar apenas com uma!
Um beijo
Manuela Baptista
Manela:
Mais uma história lindissima com pinceladas reais com um "Intermezzo" que passa na vida de todas as familias. Nós éramos mais dois, portanto sete ,que a mudança de país e não só,pôs neste Portugal pequenino
espalhados por aí....mas ficaram lembranças felizes! "A riqueza de uma infância permanece mas é raro um concerto a...sete mãos"!!
Um beijo.
Graça
Graça
O concerto a 5 mãos já me obrigou a pensar se tal seria possível.
Então inventei que se um concerto a 4 mãos é comum, bastaria juntar-lhe apenas mais uma mão.
Não sei se alguma vez aconteceu e descobri que há um pianista Brasileiro que tocou algumas vezes apenas com uma mão.
Agora o teu concerto a 7 mãos ainda vem animar mais um pouco esta loucura de muitas mãos!
Portugal é pequenino, mas é bonito, não é?
Claro não tem a grandeza de África, nem o cheiro, nem a cor, nem as línguas.
Mas quando andamos por aí temos tanto país neste país, falo das pessoas, dos Brasileiros, dos Caboverdianos, dos Moçambicanos, Angolanos, Indianos, Russos...
Um beijo
Manuela Baptista
SINAL ABERTO
Quando o sinal está aberto, mesmo se acelararmos, mais vale ir com calma.
Quando o sinal se fecha, ir devagar e ainda que acelarado e mesmo que parado, ajuda.
Quando se toca com mãos pares ou ímpares acelera-se com a calma dos audazes.
E se dos outros nos perdermos, olhos nos olhos não há como lhes dizer o que nos apartou deles.
Depois e quer o sinal se mantenha aberto ou fechado há que abri-lo prosseguindo numa acelaração calma demais.
E mais, e mais ...
( Estarei eu, agora, a ser timburteano (!?), isto pega-se! )
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 28 de Outubro de 2009
Ó Manuela
ADOREI.
... Concerto raro,mas possível.
Beijinhos,
Linda Simões
.
"
Crescer não é muito fácil e acontece devagar.
"
.
. bem mais rápido é morrer aos poucos .
. por enquanto, permaneço .
. e deixo um beijo .
. desta vez e pela primeira vez:
. total .
. porque sim .
. e saio, feliz .
. sempre,,, .
. paulo .
Bom dia, boa tarde e boa noite.
Estou afastada, mas como disse a Graça não esqueci de você. E vamos voltar aos nossos chás.
Beijo em ti e Jaime.
Renata
Jaime
aqui vai a mensagem que acabei de enviar a Tim Burton após a leitura do teu comentário, que muito agradeço e que me fez rir como há muito tempo não ria!
"Meu querido Tim
Peço-te que venhas rapidamente a este blog!
Podes estar certo que encontrarás matéria suficiente para três filmes, daqueles onde o nonsense terá o papel principal.
No primeiro, poderás ir com calma acelerando com o sinal aberto. Para este contratas uma vez mais (!)
Johnny Depp que é para estarmos certos de que não chegamos a lado nenhum.
No segundo, já com o sinal fechado, aceleras devagar, mesmo parado, porque isso ajuda.
Com o terceiro, ganharás um Óscar e chamar-se-à:
"A Calma dos Audazes Que Perdendo Contacto Visual Continuam A Dar Concertos A Várias Mãos Com O Sinal Aberto Ou Fechado"
Se precisares de mais algum esclarecimento é melhor não entrares em contacto connosco. Fala com a Jodie Foster.
Sempre ao dispor
uma sua seguidora secreta
MB"
Jaime, beijinhos!
Manuela Baptista
Possível, Linda!
Um beijo
Manuela Baptista
.intemporal.
paulinho!!!!
se estivesse aí ao pé de si
dava-lhe um beijo
na mão
Manuela Baptista
Renata!
Não sei se lhe perdoamos esta lonjura!
Ainda por cima deixa-nos sós com uma menina de 5 anos, que sendo muito querida, tem é que brincar com os meninos da sua idade.
Queremos a Renata
que clama por justiça no seu Brasil,
por melhores condições de saúde e educação,
que espalha aos quatro ventos os poetas Brasileiros
o Amor, a Amizade!
Queremos a Alegria!
Eu por mim vou já fazer queixa à Graça...
Um abraço apertado, deste lado do mar
Manuela Baptista
Manuela!
Lindas lembranças de uma infância que ficou algures cortada.
Gostei muito, muito.
Oops !
Esqueci-me do beijo
Filomena
Manela:
Finalmente voltou a Alegria e nós agora que estamos no Outono, com um passo no Inverno, precisamos dela que está por lá...na Primavera.
O café e o chá ficam mais saborosos com a sua presença,sem dúvida!
Um beijo
Graça
Oops para si também!
Filomena
Vá já a correr corrigir as provas!
Até dava jeito ter mais uma ou duas mãos, não acha?
Um beijinho
Manuela Baptista
Graça
E eu a dizer à Renata que lhe ía fazer queixinhas...
beijinhos
Manuela Baptista
Manuela,
Timburtinices à parte, citarei, a propósito, o António Lobo Antunes:
" Os meninos que nunca deixamos de ser..."
independentemente da velocidade, no meu caso, tenho tentado deixar o sinal aberto, o problema são as intermitências...
...decididamente, há que mudar as pilhas do comando!
Entretanto, para cumulo, a máquina de teletransporte (desparasitada, sem mosca) também avariou!
Belo texto Manuela,
1 Abraço
Zé
RENATA VASCONCELLOS
Belíssima,
Yesssss!!!!!
Beijinhos
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 29 de Outubro de 2009
COGITAÇÃO
Eu bem me queria parecer que havia qualquer coisa de fechado no sinal aberto e que impedia de tocar, calma ou acelaradamente, fosse com quantas mãos o fosse ...!
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 29 de Outubro de 2009
Olá Manuela,
Delicio-me sempre com estes contos e com os vossos comentários...muito humor!
Recordo a infância com saudade, um tempo de brincadeiras, de aconchego e de promessas.
Tudo passa...mas ainda é possível cumprir algumas dessas promessas douradas, feitas em jardins perfumados e debaixo de tílias....são as promessas de coração e de alma.
Sinto-me feliz por ainda as ter e ver cumpridas.
Outras não… essas, eu recordo com saudade e ainda consigo ver a cor dos olhos e dos cabelos de todos eles, quando brincávamos debaixo do alpendre e comíamos pão com marmelada, acabada de fazer....tão saborosa!
Tanto tempo...mas agora é tempo de viver o presente e sentir que se pode tocar o concerto com as mãos que existirem...o caminho é por aqui!
Obrigado por toda a partilha que aqui encontrei e que me fez voltar à minha infância...aproveitei a porta aberta!
Beijinho com muita luz
Zé
Entre o tráfego, a mosca e as pilhas lembrei-me do filme "Crash" de David Cronenberg cujos personagens tinham uma compulsão absoluta por acidentes.
Ninguém parava no vermelho!
Saiba que gosto muito de António Lobo Antunes.
Um abraço
Manuela Baptista
Ai Canduxa,
que saudades de comer pão com marmelada caseira!
E é agora o tempo dela.
Obrigada pelas palavras e por apreciar este humor, em que metemos os pés pelas mãos.
Um beijinho
Manuela Baptista
Manuela
Que histórias andam por aí com a casa das histórias???
Fofocas,please!
Beijinhos.
Ana Cristina
Manela:
Venho deixar o meu beijo de boa noite.
Hoje, estou cansada.
Se vier sol amanhã...as rosas voltam a abrir!!
Bjs
Graça
Ana Cristina
Das fofocas não sei nada, apenas li as declarações da Clara Justino e o que saiu na comunicação social.
Resumindo, a senhora não aqueceu o lugar e eu cá para mim acho que não cumpriu os objectivos.
Voilá!
Ou então já estamos todos cansados de histórias, e as minhas e as da Paula Rego estão cheias de água por todos os lados...
Agora vou chamar o macaquinho e o Pillowman que hoje é noite das bruxas e eu estou cheia de sono.
Um beijinho
Manuela Baptista
Boa noite Graça!
Um beijo
Manuela Baptista
Recordações de um tempo que passou e ao passar causou estragos...
A vida é assim mesmo. Um dia acontecerá de novo o "concerto a cinco mãos".
Um beijo.
Olá Manuela,
Andas um bocado fugida!...Desistência? Mais que fazer? Desejo é que não estejas doente!
Mandaram-me uma brincadeira e indiquei o teu blog, vai ver e se quiseres dar continuidade, tudo bem!
Quando apareces no meu blog com o teu bom humor, é sempre óptimo!...
Bjiiinos,
Marisa
Bom dia de Domingo Manuela,
Prodigiosa a sua história como sempre e as conclusões da mesma. Às vezes é assim, não se perde mesmo nada, embora eu não me possa queixar...nesse aspecto tenho sido uma priviligiada.
AS histórias da infância são no entanto sempre mágicas e são elas que estruturam muita da nossa personalidade.
Deixo-lhe um beijinho.
Branca
Minhas queridas
Graça Pires
Marisa e
Brancamar
gosto de as ter aqui!
Podem gostar
não gostar
admirar
efabular
mandar-me passear
que eu darei sempre troco.
Um abraço para as três
Manuela Baptista
Manuela,
Aproveitando a sua deixa no meu blogue sobre a pontualidade, bem como a sua réplica ao que aqui escrevi, direi:
Não me surpreende que goste do David Cronenberg. Não vi o crash, mas além da Mosca, vi também o dead zone (suponho que era o titulo original; um tipo que tem um acidente fica em coma e quando acorda tem tudo virado do avesso)
Para mim, a parte que mais me impressiona nele é a enorme capacidade que possui para trabalhar e explorar a dicotomia entre o corpo e a mente.
A propósito, e considerando o seu gosto cinéfilo,(caso ainda não tenha conhecimento, o que duvido) vai realizar-se o Estoril Film Festival 2009 de 5 a 11 deste mês, no qual, segundo entendi, vai estar presente o Francis Ford Coppola.
Para detalhes sobre programação e indicações úteis, sugiro um salto a: www.estoril-filmfestival.com
Se assistir, desejo-lhe boas sessões!
1 abraço,
Zé
Zé
Na sexta-feira Francis Ford Coppola passeava-se aqui pelo Estoril!
Também gosto dos filmes da filha, Sophia Coppola especialmente "Lost in Translation".
Obrigada pelo site do festival.
Um abraço
Manuela Baptista
Então o Francis resolve vir a Portugal, sem me avisar?
Imperdoável!
Vou ter de comentar essa desfeita com o Padrinho...
No entretanto...tenho de dedicar mais atenção aos telejornais nacionais! (só CNN, Sky News e BBC, não chegam, de facto)
1 abraço,
zé
Zé
Não saiu nos jornais. Estava incógnito!
MB
Manuela
Gostei muito das "histórias com mar ao fundo", agora acompanho vc e teu marido Jaime, ambos escrevem lindamente!
Obrigada por tua visita
Lírica
Lírica
Por um triz escapava-me, aqui nesta página!
Obrigada pelas palavras.
Um beijinho
Manuela Baptista
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