conto de outono







Com as patas dianteiras cavou a terra, deixou cair dois frutos que trazia entre os dentes e escondeu-os. Olhou à sua volta, arrebitou as orelhas, alongou o focinho e cheirando o ar, certificou-se de que estavam calmos os campos, douradas as árvores, avermelhado o tapete de folhas pelo chão. E confundia-se a raposa avermelhada e branca com as folhas, as árvores e os campos e o chão.




Ao crepúsculo chegou ouriço, os sentidos alerta, a fome a apertar. Silencioso e rasteiro depressa descobriu os frutos escondidos, descascou-os com os dentes e comeu-os. E repetidas vezes os encontrou, pois a raposa era respigadora e guardava o que lhe parecia excessivo num dia, para aqueles dias em que a terra gelava e o alimento escasseava.
E foi assim que a raposa e o ouriço se encontraram e fizeram as tocas lado a lado e nunca trocaram uma palavra, porque como é sabido, a sua linguagem traduz-se de maneira diversa. Para a raposa, o ouriço era pequeno e inofensivo e o território de um, era o território do outro e tão pouco agressivo é o ouriço, como a raposa. Solitários, os dois.
Quando o vento norte chegar, o ouriço enrolar-se-á e dormirá até à primavera. A raposa ficará mais magra, a cauda menos brilhante e menos peluda e os frutos escondidos, raros e valiosos.
E a mim, que troco palavras por traços, confundem-me estes contos antigos, avermelhados e dourados como as folhas e as árvores e as caudas e os espinhos e a terra e o chão.












9 comentários:

Maria Eu disse...

Ah, ouriço malandrão!

Um Outono feliz,Manuela! :)

Jaime Latino Ferreira disse...

MANUELA BAPTISTA


... confundem-te porque os traças tu, saborosa, deliciosamente nas margens do sonho ...


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 26 de Setembro de 2017

Graça Pires disse...

Vim aqui, como se fosse a menina que gosta que lhe contem histórias...
E esta é maravilhosa. Um ouriço e uma raposa que se confundiam com as folhas caídas das árvores e que faziam da terra o seu chão. Mágicos os teus desenhos, Manuela.
Um beijo.

mz disse...

Que bem desenha com as palavras, Manuela!
Também eu chego aqui como se fosse um lugar especial, sempre à espera de me deliciar com os seus contos, as suas fábulas. Adoro.

Um abraço.

*Lisa_B* disse...

Querida Manuela,
há quanto tempo eu tinha perdido o acesso ao meu blog e a todos os amigos que ficaram aqui encerrados.
Tão contente fiquei hoje por conseguir desbloquear finalmente o meu blog.
Já nem sei me orientar aqui, após tanto tempo...a ver o que consigo fazer :)
Este é apenas um comentário teste pois nem sei se fica registado,dado que a minha conta estava bloqueada não sei.
Lindoooo tudo que li e como agora o formato do blog está.
Beijinhoss nossos
Lisa e B.

manuela baptista disse...

Lisa,
o teste foi bem sucedido!

seja bem vinda e saudades ao rapaz do pensamento voador :)

. intemporal . disse...

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. "andou" pela blogosfera durante algum tempo . uma deusa.de.andar.por.casa . a qual também insistia em trocar "palavras por traços" . mas logo se veio a descobrir que se tratava de plágio .

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. :) . antiga era . os contos não . :) .

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. íssimo feliz .

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. intemporal . disse...

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. e a ki.ti titã onde "andã" ? . :))) .

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manuela baptista disse...

a Ki.ti anda de quatro ou seja,

é____________uma___________gata feliz


assim traçaria alguém :)