Preciso apenas de alguns segundos para escrever este
instante. Partícula e filamento.
A dourar setembros nos vinhedos e nas figueiras bravas,
os muros de pedra solta, as lagartixas ao sol. Os frutos já se metamorfosearam
em crisálidas doces, enfrascados, ébrios de fervura e pau de canela. No inverno a
escassez apertará e o que é excessivo hoje, fará falta amanhã. Pelas ruas
desliza o cheiro a mosto, a uva de mesa é moscatel e eu gosto dela com pão e
manteiga.
As noites ainda são de estrelas e a minha irmã diz poemas
na companhia dos grilos e das cigarras. Perdemo-nos de riso mas encontramo-nos
logo a seguir.
No último dia de setembro juntamo-nos no pátio das
traseiras e o meu pai pega na câmara Kodak e monta o tripé. As pernas inquietas
e queimadas pelo sol, os dentes brilhantes a rir disparates e o cão aos saltos
a lamber toda a gente. Estranha, a ausência final de som.
Ao lado deste retrato a preto e branco, permanece um copo
de vidro transparente. Vulgar, banal. E um fio de alfazema a secar.
14 comentários:
MANUELA BAPTISTA
- ai se o escrever fosse um instante, partícula e filamento de rompante, da fotografia teria nome sonante, um ai e nada mais que som cortante -
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 14 de Setembro de 2013
Sempre sentiremos falta....
Beijo Lisette.
O país daqueles pescadores cujas linhas eram linhas finas e os fios de peixe se tornavam fios ainda mais finos e os reflexos do mar eram a confusa maresia, do mar, ou fio ou vida
de
fina
ainda mais linha fina
Os pesacadores de linha fina e maresia, e a linha fina que mal se via, fina linha, vida via, o fio da vida, linha fia
Olá, Manuela!
Sendo ínfimo, tem todo o tamanho do mundo este doce recordar de princípios de Outono - quando a vida era ainda Primavera.
Lindo!
Abraço amigo, bom Domingo.
Vitor
Basta um instante e corre o pensamento para dias distantes. Trazem cheiros e sabores e lembranças dos nossos amores.
Que lindo fio dourado te trouxe Setembro, Manuela.
Um bom domingo.
.
.
. a.setembro.me neste instante . que me é a vida inteira . as manhãs que foram . estas tardes que são . porque as noites estão guardadas para o inverno . claramente aqui . onde cada noturno é sempre um clarear . a tecer este tear .
.
. rodas de um relógio mágico .
.
. este texto traduz um regresso . há tanto prometido . há tanto desejado . muitos parabéns . hoje sinto.me ainda mais em casa . como sanca que flutua em todo o céu aberto . que nos é pretexto . e tecto .
.
. íssimo mais do que feliz .
.
.
Kriu?
Essa coisa das pernas inquietas, por períodos de trinta ou de quarenta minutos, não deixam de nos agradar...
Kriu!
A lamber toda a gente é como cão diz...
Há gente munida de tal gordura, com tanto sebo, que lambê-las seria como que fabricar pastilhas elásticas instantâneas, em tiras com sabor a banha, agridoce...
Quem diria que um pequeno lapso na rapidez de inscrição de um comentário levaria a que tivesse tido a possibilidade de improvisar dois poemas, um atrás do outro, pensando que tinha perdido o primeiro.
Se não for acaso, foi uma excelente oportunidade.
Bom domingo :-)
depois de ler este texto, com a qualidade de todos os textos da Manela, eu só ouso dizer (escrever).
setembro é o meu mês
:)
Conseguiste reproduzir a atmosfera de uma época que já lá vai, pelo menos para nós, mais citadinos, mesmo vivendo nas aldeias.
E fizeste-o com a excelência que te é habitual.
Manuela, tem uma boa semana.
Beijo.
O Nilson disse tudo e depois dele
eu não me atrevo a dizer muito
mais. Também gosto muito de
Setembro e tenho recordação de
outros que foram melhores.
Agradeço os seus votos de parabéns.
Beijinhos
Irene Alves
Manuela
beijinhos de alfazema
Enviar um comentário