O ar estava carregado, numa recusa em entrar pelas
narinas e circular, vaguear até aos pulmões, num prenúncio de tempestade seca,
que magoa, faz doer.
Pior que o trovão, a hiena, mais assustador que o vento
seco, o leopardo. Leão, o rei, convocou todos os animais e disse-lhes que era o
mais bonito, o mais rápido corredor de curtas distâncias, o mais alto dos
felinos, o que possuía os dentes mais afiados a rasgar a carne das presas, o
que rugia em tons mais graves. Eva troçou dele, mais alta seria ela quando
acabasse de crescer. Mas a sua voz mal se ouvia, assim era a sua natureza de
girafa. Também lhe faltava um corno, aquele que deveria crescer no meio da
testa. Ao nascer, caíra de uma altura de dois metros e batera com a cabeça numa
pedra. Não deveria estar ali, a pedra. Mas estava. A mãe distraíra-se com as
folhas tenras das acácias, naquela compulsão diária que obriga estes seres a
mastigar, a ruminar quase tantas horas como aquelas que o dia tem. Chamara-lhe
Eva, por ser única e primeira. O deserto avançava e trazia o que possuem de
belo as noites profundas de calor, o crepitar irreal das estrelas.
Eva era independente e solitária. Sem o apetite devorador
dos seus pares, afastava-se, curiosa e concentrada, o nariz para cima, o
pescoço pouco flexível, as pernas dianteiras uns centímetros mais compridas do que
as traseiras, os olhos imensos e pestanudos. Quando se sentia cansada,
deitava-se e dormia, que é uma coisa que nenhuma girafa ousa fazer. Se um
predador atacasse, a falta de agilidade ser-lhe-ia fatal e não teria tempo de
se levantar.
No entanto o leão tinha bom ouvido e apesar do ribombar
súbito da trovoada descobriu-a no meio dos felinos, enfureceu-se e rugiu incitando-os à caçada. Eva sentiu o perigo, desejou ser apenas olhos,
mas foi pernas, ganhou velocidade, as girafas adultas alcançaram-na,
rodearam-na e correram juntas mais um quilómetro. Depois pararam subitamente e
entre as árvores foram troncos, mimeticamente semelhantes, os pescoços
entrelaçados, os músculos tensos, as patas firmes na terra.
Os leões, os leopardos e as hienas deambularam humilhados
durante dois dias.
19 comentários:
MANUELA BAPTISTA
Girafinha do corninho atrofiado
que por isso via mais do que o montado
Linda!
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 22 de Junho de 2013
Que eu saiba a Eva não é um rinoceronte ...
Vai, vai beber um café forte!
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. mimética . a imagética sustenta a história . conferindo.lhe um sentido mais do que real . talvez alcançado pelo aveludado de uma escrita que aqui é canção para sempre .
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. bravo ,,, nelita querida . bravíssimo . !!! .
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. íssimo feliz .
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Não há limites para o seu imaginário.
Eva como todos os outros animais aprenderam a leis da selva e as leis da vida.
As figuras de animais movem-se com o ribombar da trovoada e o rugir dos leões...
...quem sobreviverá ?
Esta história está mal contada
o terceiro corno é no nariz, não é na testa
não percebes nada de felinos
Continua leitor assíduo da sua maravilhosa forma de me fazer pensar...
Kriu?
Ou eu estou daltónica hoje, ou levaste as aves à barrela...
Kriu!
Além de imponentes, inteligentes...
Fabulosa, bela, nas palavras e nas imagens...Aqui, me encanto!
Beijos, Manuela,
da Lúcia
Reconheço na girafa uma criança.
Quem dera que todas tivessem troncos que as protegessem dos perigos desta selva humana.
Os animais com o seu instinto ensinam-nos muito e a Manuela presenteia-nos sempre com uma mensagem.
Um abraço,
mz
Kriu?
Finalmente tenho tempo para vir comentar esta página!
O primeiro desenho representa muito bem o Té, fossilizado, e o segundo desenho obriga-me a deixar-te este pedido:
Visto já não ser preciso, devolve-me então o cobertor de papa!
Kriu!
Mais uma história de encantar.
Com desenhos primorosos.
Gostei muito, como sempre.
Manuela, querida amiga, tenha um bom resto de domingo e uma boa semana.
Um abraço.
A lei da selva, a lei da vida!
Adorei ler.
Bjs e boa semana
uma história de encantar com os perigos da selva, ou da lei da selva...
muito imaginativa, com uns desenhos muito belos a ilustrar...
gostei!
boa semana.
beijo
Outro dia, na National Geographic estava justamente vendo a vida das girafas nas savanas africanas. Corajosas e indefesas, já levam logo um 'tombaço' quando nascem! Depois são as sentinelas da África selvagem, vendo tudo lá de cima, com sua superioridade inquestionável. Corajosa girafinha!!!!!
Um beijo
Bia
www.biaviagemambiental.blogspot.com
Ainda bem que se salvou...
Ainda bem que teve ajuda...
Há muito quem não tenha...
Há muito quem esteja a ser
devorado...
Bj.
Irene Alves
Vivemos em uma selva....beijo Lisette.
Minha querida
Voltando (ainda devagar), mas com muitas saudades e agradecendo o carinho deixado durante a minha ausência.
Um beijinho com carinho
Sonhadora
Bem aventurado aquele que já consegue receber com a
mesma naturalidade o ganho e a perda, o acerto e o erro,
o triunfo e a queda.
De todas as minhas conquistas a maior delas são os meus amigos,
e amigas.
De sorriso puro no rosto de uma criança.
Acredite na fé, mais força, na esperança e na razão.
Descubra-se , ame-se, perdoe-se!
Viva intensamente
a cada Dia da sua vida.
Que sua noite seja de infinita paz ,
viaje comigo tenho certeza ,
que se sentira muito feliz.
Beijos paz e muito amor pra você.
Evanir.
Olá, Manuela!
O joelho cá vai melhorando, devagarinho.O meu obrigado pelas palavras amigas, que só agora agradeço...
E ainda chego a tempo de por aqui encontrar a Eva girafa - moradora numa selva que certamente fará inveja à nossa...
Um abraço; bom fim de semana.
Vitor
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