Zeferino tinha um barco.
Pintado de branco, duas riscas à volta, uma amarela a outra encarnada, na proa um olho espreitava para o proteger e um nome Estrela do Mar.
Todos os dias muito cedo, mesmo antes do sol nascer, ouvia-se o pequeno e gasto motor a arrancar pelo mar dentro e Zeferino à ré, a cara salpicada de sal, os olhos atentos à loucura das ondas, as redes enroladas a seus pés, a água, o pão e a fruta num cesto de vime, o coração contente pela liberdade do dia.
No cais os pescadores acenavam-lhe, acabados de chegar de mais uma noite de faina no mar alto.
Zeferino partia quando os outros regressavam.
Em terra navegava contra a corrente, no mar aprendera com o avô as antigas artes da pesca, as sacadas, as armações, as redes de emalhar e a arte cercadora ou traineira.
O Avô ensinara-lhe tudo o que sabia e aquilo que pensava que não sabia, como a arte do amor.
Aos dez anos Zeferino era magrinho, pequenino e os outros rapazes gozavam com ele:
-Zeferino, ó Zeferino! Quem te fez tão fino?
Ele ficava triste e repetia baixinho a cantilena que os homens entoavam nas traineiras durante as longas horas em que esticavam as redes: "Ó leva, leva, leva...arriba e leva" e sentia que a crueldade dos outros se afastava e o transformava num menino alto e robusto.
Os rapazes gostavam de jogar à bola, Zeferino gostava de acompanhar o Avô.
Nas noites de festa enquanto os outros dançavam, Zeferino lia as estrelas e aprendia a orientar-se por elas e ao som de uma concertina cantavam os dois até o dia chegar.
E fora com o Avô que construíra aquele pequeno barco a motor, a sua Estrela do Mar, devagar como quem desenha um sonho e o Avô dizia:
-Um dia Zeferino, neste teu barquinho de prata vais chegar mais longe do que a mais bem apetrechada traineira! E mesmo que eu não esteja junto de ti, a tua Estrela estará e far-te-á companhia.
-Onde vais, Avô?
-Tenho ainda muito que pescar e a vida Zeferino, não é apenas este mar!
Depois de o Avô partir, Zeferino nunca mais pescara nem comera um peixe.
Pintado de branco, duas riscas à volta, uma amarela a outra encarnada, na proa um olho espreitava para o proteger e um nome Estrela do Mar.
Todos os dias muito cedo, mesmo antes do sol nascer, ouvia-se o pequeno e gasto motor a arrancar pelo mar dentro e Zeferino à ré, a cara salpicada de sal, os olhos atentos à loucura das ondas, as redes enroladas a seus pés, a água, o pão e a fruta num cesto de vime, o coração contente pela liberdade do dia.
No cais os pescadores acenavam-lhe, acabados de chegar de mais uma noite de faina no mar alto.
Zeferino partia quando os outros regressavam.
Em terra navegava contra a corrente, no mar aprendera com o avô as antigas artes da pesca, as sacadas, as armações, as redes de emalhar e a arte cercadora ou traineira.
O Avô ensinara-lhe tudo o que sabia e aquilo que pensava que não sabia, como a arte do amor.
Aos dez anos Zeferino era magrinho, pequenino e os outros rapazes gozavam com ele:
-Zeferino, ó Zeferino! Quem te fez tão fino?
Ele ficava triste e repetia baixinho a cantilena que os homens entoavam nas traineiras durante as longas horas em que esticavam as redes: "Ó leva, leva, leva...arriba e leva" e sentia que a crueldade dos outros se afastava e o transformava num menino alto e robusto.
Os rapazes gostavam de jogar à bola, Zeferino gostava de acompanhar o Avô.
Nas noites de festa enquanto os outros dançavam, Zeferino lia as estrelas e aprendia a orientar-se por elas e ao som de uma concertina cantavam os dois até o dia chegar.
E fora com o Avô que construíra aquele pequeno barco a motor, a sua Estrela do Mar, devagar como quem desenha um sonho e o Avô dizia:
-Um dia Zeferino, neste teu barquinho de prata vais chegar mais longe do que a mais bem apetrechada traineira! E mesmo que eu não esteja junto de ti, a tua Estrela estará e far-te-á companhia.
-Onde vais, Avô?
-Tenho ainda muito que pescar e a vida Zeferino, não é apenas este mar!
Depois de o Avô partir, Zeferino nunca mais pescara nem comera um peixe.
As redes no fundo do seu barco, estavam ali para o recordar que as armadilhas são falsas e quanto aos peixes, gostava de lhes tocar com a ponta dos dedos, quando seguia à bolina ao sabor do vento e os cardumes vinham à superfície em fervilhantes corridas.
Às vezes ainda ouvia:
-Zeferino, ó Zeferino! Quem te fez tão fino?
Mas agora já não afinava, Zeferino era um homem bom e todos gostavam dele.
Um dia, ao entardecer Zeferino não voltou, nem na manhã seguinte, nem nas outras a seguir a esta.
Por vezes, em noites de nevoeiro, os pescadores ouvem ao longe o som de uma concertina e julgando avistar a Estrela do Mar, sabem de antemão que a pesca será boa.
Zeferino tinha um barco.
Às vezes ainda ouvia:
-Zeferino, ó Zeferino! Quem te fez tão fino?
Mas agora já não afinava, Zeferino era um homem bom e todos gostavam dele.
Um dia, ao entardecer Zeferino não voltou, nem na manhã seguinte, nem nas outras a seguir a esta.
Por vezes, em noites de nevoeiro, os pescadores ouvem ao longe o som de uma concertina e julgando avistar a Estrela do Mar, sabem de antemão que a pesca será boa.
Zeferino tinha um barco.
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Esta é uma página suave, onde se dá conta que ter um barco é possuir um sonho.
Manuela Baptista
Estoril, 28 de Agosto de 2009
12 comentários:
POSSUIR UM SONHO
Possuir um sonho
construir um barco
estrela de um avô
ao que vou
ao que vou
Arrastar as redes
a contra-corrente
é das gentes ter
imensa vontade
que impede ver toda maldade
É já ter bondade
a idade
a idade
é eternidade
que mansa nos invade
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 28 de Agosto de 2009
Jaime,
Obrigada pelo poema.
Manuela Baptista
Muito Obrigada, por toda atenção que me dá, o especial do mundo virtual é essa afinidade de pessoas boas, com bons sentimentos e que trazem consigo sempre uma caneta e um caderno nas mãos.
Amei seu poema.
Renata Vasconcelos.
ALEGRIA
Boa Amiga,
Sabia que minha mulher tem um carinho especial por Si?
Saiba também que, se logo o Seu nome é uma lufada de ar fresco, amiga Renata, se se refere ao meu poema, presunção minha (!), Lhe agradeço do fundo do coração.
Um beijinho
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 29 de Agosto de 2009
Manuela,
Fez-me lembrar Alves Redol.
Quando leio as suas histórias fico assim um bocado parada, a saborear, maravilhada, com um sabor bom, quase igual àquele que fica na boca quando comemos um chocolate.
Um beijinho
Renata
Às vezes os poemas surjem assim de repente, configurando o momento que passa. Mas a inspiração, vou buscá-la às vossas palavras e neste caso concreto às suas palavras e às dos seus comentadores.
É assim um pouco um trabalho de equipa...
Um beijinho
Manuela Baptista
Filomena
Mas que elogio! Fazer lembrar Alves Redol é obra. Eu também sou do Ribatejo como ele, mas não sei se sou neo-realista.
Mas o melhor elogio é essa compararação com os efeitos do chocolate! Percebo perfeitamente o que quer dizer e é muito doce.
Eu quando invento estes personagens, passam a ter vida própria e também fico assim a contemplá-los e não me apetece separar deles, apagá-los com uma nova página.
Desta vez foi-me difícil deixar para trás a Joana Judite Julieta.
Um beijinho
Manuela Baptista
Manuela
O Zeferino transborda alegria, serenidade e convida-nos a embarcar num passeio em mar de prata onde encontraremos de certeza o Zeferino e outros amigos.
1 beijinho.
Nini
MANUELA
Vês Manela ...!
O Zeferino fica, a Estrela do Mar traz chocolates, és comparada a um Alves Redol
e a nave vai, levando-nos consigo e a todos os teus personagens!
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 29 de Agosto de 2009
O sono tomou conta de mim.
Espero ter um lugarzinho num barquinho de prata, navegando à bolina na companhia de um pescador que não pesca nada,que não grelha peixe,mas que conhece as estrelas e o sentido dos vendavais.
E, ó Zeferino, se não for pedir demais, leva também:
a Nini
o Jaime
a Filomena
e
a Alegria
e uns figos em cesto de vime para acompanhar o pão.
Todos juntos, não temos mais do que a leveza de uma Estrela.
Manuela Baptista
Querida manuela.
Serelepe aqui no Brasil significa: serelepe
se.re.le.pe
adj 1 Faceiro, gracioso, provocante. 2 Buliçoso, vivo. 3 Ardiloso. sm Zool V caxinguelê. s m+f Pessoa ágil, esperta, viva. Mas adorei que em Portugal é uma espécie de esquilo.
Beijos e amei "Zeferino"
Renata Vaconcellos.
Renata
E eu pensava que era um esquilo brasileiro!
Mas tem graça porque os esquilos são provocantes, ágeis e vivos!
Afinal falamos a mesma língua.
Um beijinho
Manuela Baptista
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