Era uma vez um jovem pássaro feliz. Assobiava com o vento
vindo do mar, debicava insetos entre as agulhas dos pinheiros, rasava a caruma
do chão, pousava no ramo mais alto e imaginava a sua cabeça preta a tocar nas
nuvens. O pássaro ignorava a existência de outras aves e presumia o mundo
composto de árvores, ramos, copas, céu, estrelas na noite, sol de dia, chuva,
frio, calor, trovões e relâmpagos, aranhas, moscas e sementes. E a vida do
pássaro pequeno era calma e leve como as suas penas.
Um dia uma poupa sobrevoou o pinheiral e avistou o pássaro.
Curiosa, foi-se aproximando até que pousou junto dele, abrindo a crista. O
pássaro assustou-se, bateu as asas três vezes e piou. A poupa, imitando-o, piou
outras três, bateu as asas e voou. O pássaro, pasmado e inquieto, esqueceu-se
dos insetos e dos frutos e plantou-se no topo das árvores com o intuito de
alcançar o longe e a distância e poder ver a poupa, mas ela não regressou. O
pássaro conformou-se, no entanto já não se sentia o mesmo. Desgostou-se dos
insetos voadores e das aranhas e cismava se o pinheiral não seria limitado e as
nuvens mais altas. E uma tarde a poupa voltou. O coração do pássaro saltou-lhe
no peito e perguntou-lhe, quem és? Um pássaro como tu, respondeu a poupa. O
pássaro não sabia que era um pássaro e a poupa explicou-lhe que ninguém sabe
exatamente quem é, até encontrar um ser semelhante a si.
Então a poupa falou-lhe do mundo para lá dos pinheirais e
das aves que o habitam. Da perdiz que gosta de atravessar as estradas, do rouxinol cantor, da elegância e beleza do pavão, do guarda-rios que os guarda bem, do
mergulhão-de-crista e da sua coragem em mergulhar, da viuvinha-bico-de lacre
que nunca está sozinha, da destreza do falcão, da coruja das torres que pia de
noite e dorme de dia. Eram tantos e tão variados que o pássaro estonteou e a
poupa calou-se, não sem antes lhe dizer e tu, pássaro pequeno e feliz, sabes o
teu nome? Não sabia.
A poupa e o chapim-carvoeiro partiram numa longa viagem
de reconhecimento de outras aves, de rios, de planícies, de carvalhais, de bosques e de penhascos também. Um dia o chapim sentiu saudades do pinheiral,
do cheiro a maresia trazido pelo vento, dos insetos e das pinhas repletas de pinhões
e regressou. Pelo caminho avistou um chapim-azul e um chapim-real e no pinheiro
mais alto esperava-o um chapim-carvoeiro. Por fim o pássaro feliz soube quem
era.
7 comentários:
MANUELA BAPTISTA
E tu, quem és?
E sabendo quem és, crescerei porque ao dizeres quem és mais eu sou.
Bravo!
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 25 de Maio de 2018
Aprender aprender sempre
Bj
Lindo!...
Simplesmente:lindo!...
Pois é, Manuela. Só conhecendo quem somos, encontramos o que é comum a todos… Fazes sempre sentir-me a menina encantada com a magia das tuas histórias. Obrigada, minha Amiga.
Uma boa semana.
Um beijo.
Assim é.Na natureza as criaturas reconhecem-se na confrontaçáo que travam com as outras.Todas, inclusivé eu, pássaro pecador me confesso chapim.
Andei não sei por onde, acho que desatinei. No cocuruto dum pinheiro negro parei, quanto tempo não sei, até que me fugiu dos pés com o som duma maquineta desumana.
Tinha saudades, Manuela.
Agostinho
aqui há sempre um ramo à sua espera
um abraço
Reconhecer quem somos, é uma busca constante.
Conto maravilhoso e estou a perder-me aqui porque hoje tenho tempo. E maravilhoso é também, como se constrói um conto de pássaros tão bonito.
Por vezes esqueço-me que sou gente, e escondo-me para poder ver a beleza dos pássaros.
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